Licenciamento Ambiental: Câmara Reafirma Exclusão de Mineração de Alto Impacto na Lei Geral – Entenda os Desafios!
- FFA Legal
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No último dia 08 foi apresentado, pela Câmara dos Deputados, no âmbito do Projeto de Lei 2159, de 2021, o parecer sobre as emendas sugeridas pelo Senado Federal quando da aprovação do texto no final de maio.
O texto contido no citado Parecer volta a excluir a atividade mineral de significativo impacto ambiental do texto do PL sobre a Lei Geral do Licenciamento Ambiental.
O Projeto de Lei em questão, de autoria do Deputado Federal Luciano Zica (PT/SP), busca uniformizar e padronizar o licenciamento ambiental em todo o território nacional, introduzindo modalidades como o procedimento bifásico, a Licença Ambiental por Fase Única (LAU), a Licença por Adesão e Compromisso (LAC) e a Licença de Operação Corretiva (LOC).
De 32 emendas apresentadas pelo Senado, apenas foram rejeitadas as Emendas nº 1, 5, 14 e 9, essa última de forma parcial.
Dentre as Emendas aprovadas, destacamos as seguintes, como sendo de maior impacto para o setor mineral:
# | CONTEÚDO | COMENTÁRIO |
3 | Inclui o Licenciamento Ambiental Especial para Atividades ou Empreendimentos Estratégicos | Vimos a introdução como positiva, mas é importante a definição do que serão projetos estratégicos, uma vez que a emenda determina que tais empreendimentos serão definidos em decreto mediante proposta bianual do Conselho de Governo, que dimensionará equipe técnica permanentemente dedicada à função |
7 | Inclui a validade mínima e máxima da LAC que não vinha no texto original, sendo 5 (cinco) anos e, no máximo, 10 (dez) anos, consideradas as informações apresentadas no RCE | O Brasil deveria investir na atividade fiscalizatória contínua, regular e severa. Criar uma gerência de pós licença que avaliasse o cumprimento de condicionantes e fiscalizasse o empreendimento com uma certa regularidade. Prever o intervalo mínimo e máximo de 5 a 10 anos é importante para ter um marco inicial, mas o órgão ambiental não deveria fiscalizar apenas quando do pedido de renovação das licenças. |
17 | exclui a “possibilidade de aplicação da modalidade por adesão e compromisso” no licenciamento corretivo | Entendemos que se já é corretivo, ou seja, visa corrigir algo que estava desregularizado e ou em funcionamento sem as devidas licenças, não vemos problemas que esta regularização seja na modalidade tradicional até porque em razão da natureza corretiva é preciso intensificar a atuação fiscalizatória. |
25 | Inclui a responsabilidade subsidiária quanto a danos ambientais decorrentes da execução da atividade ou do empreendimento para pessoa física ou jurídica, pública ou privada, inclusive instituição de fomento, que contrate e/ou financie empreendimento ou atividade sujeitos a licenciamento ambiental, caso não exijam do empreendedor a apresentação da licença ambiental correspondente. | Essa inclusão pode gerar um grande impacto negativo, pois transfere ao particular a obrigação de fiscalização de legalidade do licenciamento, sendo certo que existe um risco de diversas instituições simplesmente deixarem de financiar projetos para evitar quaisquer exposições, inclusive as de responsabilidade subsidiária, ainda que na medida e proporção de sua contribuição. Ainda, há que se considerar que nem toda fase do projeto minerário está sujeita ao licenciamento ambiental. No entanto, não é razoável esperar que o ente contratante ou financiador tenha conhecimento jurídico para avaliar cada caso. |
30 | Acrescenta artigo que determina o prazo máximo de 30 dias para decisão sobre pedidos de alteração de titularidade, não cabendo majoração de condicionantes ambientais quando essa alteração não provoca incremento dos impactos ambientais do empreendimento ou atividade licenciada | Considerando a morosidade dos órgãos ambientais para tratar assuntos dessa natureza, a medida sugerida é essencial, pois visa a celeridade e eficiência afim de garantir que o título reflita à realidade daquele projeto além da devida segurança jurídica tanto para o anterior titular quanto para o novo titular das licenças e de suas obrigações. |
32 | Acrescenta artigo que estabelece que, no que pese a competência compartilhada dos órgãos municipais, estaduais e federais, o órgão ambiental competente que emitir a licença deverá ser notificado, em até 24 horas, de qualquer medida imposta por órgãos ambientais de outros entes federativos, sob pena de perda do efeito dessas medidas. Ainda, em caso de lavratura de autos de infração por órgão ambiental diferente do órgão licenciador, prevalecerá a manifestação técnica do órgão licenciador | A inclusão de prazos desta natureza (24 horas) é inócua. De toda forma é positivo a determinação que visa interromper atuações pelas entidades ambientais que não realizaram o licenciamento ambiental, logo, menos conhecedoras da realidade daquela regularização e realidades do projeto. E sim, concordamos que em caso de lavratura de autos de infração por entidades ambientais variadas, deve prevalecer a decisão técnica do órgão licenciador. |
Uma das mudanças mais significativas foi a rejeição da Câmara à Emenda nº 1, que incluía os empreendimentos minerários de alto risco ou grande porte entre os beneficiados por um modelo próprio de licenciamento. Com a retirada desses empreendimentos, os mesmos continuarão submetidos às normas do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), e não a regras específicas da nova lei.
Entendemos que a principal motivação para a exclusão de projetos de mineração considerados de significativo impacto ambiental decorre, em grande parte, do uso de barragens de rejeitos como método de disposição dos resíduos oriundos do beneficiamento mineral. No entanto, tal motivação não se sustenta, uma vez que essa atividade é amplamente regulada por um conjunto robusto de normas federais e estaduais. Essas normas, por serem mais restritivas e rigorosas, impõem medidas de controle e exigências específicas que asseguram a estabilidade e a segurança dessas estruturas, garantindo o exercício da atividade dentro dos parâmetros técnicos e ambientais adequados.
A exclusão de atividades de significativo impacto ambiental do rol de abrangência da legislação específica impede o setor mineral de contar com um marco normativo unificado para empreendimentos de grande porte. Com isso, a regulamentação permanece subordinada a normas gerais mais antigas, editadas em 1981[1], 1997[2] e 2011[3], que, embora ainda em vigor, carecem de atualização para refletir os avanços tecnológicos, sociais e ambientais do setor.
Dessa forma, entendemos que a rejeição dessa Emenda representa um retrocesso no que diz respeito ao objetivo do Projeto de Lei, qual seja, uniformizar o processo de licenciamento ambiental no Brasil.
No Brasil, especialmente no campo do Direito Ambiental, é inegável a existência de uma enorme quantidade de atos normativos. Há um verdadeiro emaranhado de normas que dificulta a compreensão e a aplicação do direito, diante da desordem hierárquica entre diferentes instrumentos legais e infralegais, tais como resoluções do CONAMA, portarias de órgãos ambientais, normas estaduais, instruções normativas, resoluções municipais, além de lacunas na legislação federal. Essa desorganização compromete a segurança jurídica, estimula conflitos entre entes federativos e favorece a judicialização frequente de matérias ambientais.
Nesse cenário, o Projeto de Lei nº 2.159/2021, que propõe a instituição de uma Lei Geral do Licenciamento Ambiental, representa uma tentativa concreta de reorganizar esse sistema normativo fragmentado. Sua principal finalidade é uniformizar conceitos, procedimentos e competências, por meio de uma norma de caráter geral, conferindo-lhe hierarquia superior em relação às resoluções administrativas e aos atos infralegais.
A consolidação legislativa por meio de uma regra geral promove não apenas a coerência normativa, mas também resgata o papel estruturante do Poder Legislativo na formulação das políticas públicas ambientais. A definição de critérios nacionais, parâmetros técnicos unificados e modalidades de licenciamento claras responde a uma demanda histórica por maior previsibilidade e racionalidade procedimental tanto por parte dos empreendedores quanto dos órgãos ambientais.
Ressalte-se, contudo, que a existência de uma Lei Geral não elimina a necessidade de regulamentações complementares. O desafio reside em garantir que essas normas infralegais sejam subordinadas, harmônicas e não contraditórias em relação à norma geral federal, em conformidade com os princípios estabelecidos na Lei Complementar nº 140/2011 e na pirâmide normativa constitucional.
O PL nº 2.159/2021 não deve ser interpretado como um instrumento de mera simplificação burocrática, mas como uma ferramenta jurídica essencial para restaurar a ordem normativa, fortalecer a autoridade legislativa e assegurar a efetividade do licenciamento ambiental como instrumento técnico, jurídico e democrático de proteção ao meio ambiente.
A ausência, até hoje, de uma Lei Geral sobre o tema expôs empreendedores a um mosaico normativo instável e de difícil interpretação, marcado pela sobreposição de exigências, conflitos de competência entre entes federativos e entendimentos divergentes.
Nesse contexto, o PL nº 2.159/2021 representa não apenas um avanço técnico, mas também um esforço de resgate da lógica jurídica estruturante, ao reafirmar a primazia da lei como elemento ordenador da política pública ambiental e buscar corrigir o desequilíbrio normativo que, há décadas, compromete a previsibilidade regulatória no Brasil.
Contudo, causa perplexidade a exclusão do setor mineral, especificamente dos empreendimentos de grande porte, do Projeto de Lei. A atividade mineral é essencial e estruturante para o desenvolvimento nacional, fornecendo insumos fundamentais para diversos setores da economia, incluindo infraestrutura, energia, tecnologia e saúde. Ao retirar a mineração do alcance da nova legislação, o texto legal perpetua as incertezas e instabilidades normativas que tanto se pretende superar. Além disso, reforça um tratamento discriminatório e contraditório para um setor que, justamente por sua complexidade e relevância estratégica, deveria estar entre os primeiros a ser contemplado por uma legislação moderna, uniforme e segura.
Excluir a mineração do Projeto de Lei é não apenas um equívoco técnico, mas também um retrocesso político. Ignora-se, assim, a contribuição da atividade mineral para a transição energética, para o desenvolvimento regional e para o fortalecimento da soberania nacional em cadeias críticas de produção. Em vez de excluir, o caminho correto seria garantir regras claras, estáveis e proporcionais, que conciliem a proteção ambiental com a viabilidade dos empreendimentos minerais de forma responsável e sustentável.
Referencias:
Texto original do PL (https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=8979282&ts=1750882927792&disposition=inline).
Parecer do Senado com as 32 Emendas (https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=9957469&ts=1750882938911&rendition_principal=S&disposition=inlinee).
Parecer da Câmara, objeto dessa análise https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=2951582&filename=Tramitacao-L%202159/2021%20(N%C2%BA%20Anterior:%20PL%203729/2004)).
[1] LEI Nº 6.938, DE 31 DE AGOSTO DE 1981 - Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências.
[2] RESOLUÇÃO CONAMA Nº 237, de 19 de dezembro de 1997.
[3] LEI COMPLEMENTAR Nº 140, DE 8 DE DEZEMBRO DE 2011