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Mineração em faixa de fronteira


MINERAÇÃO EM FAIXA DE FRONTEIRA: A NECESSIDADE DE SIMPLIFICAÇÃO DO PROCESSO DE ASSENTIMENTO PRÉVIO

A Lei Federal nº 6.634/79, promulgada durante o regime militar Brasileiro, regulamentada pelo Decreto 85.064/80 e posteriormente confirmada pela Constituição Federal, promulgada em 1988, estabelece que é considerada área indispensável à Segurança Nacional a faixa interna de 150 Km (cento e cinquenta quilômetros) de largura, paralela à linha divisória terrestre do território nacional.

Tal lei estabelece que, entre outras atividades, pesquisa, lavra, exploração e aproveitamento de recursos minerais, salvo aqueles de imediata aplicação na construção civil, assim classificados no Código de Mineração, dentro da faixa de fronteira, só poderão ser realizadas por pessoas – físicas ou jurídicas – que satisfaçam algumas condições e desde que o Conselho de Segurança Nacional – atual Conselho de Defesa Nacional (CDN) – conceda assentimento prévio.

Os requisitos mínimos que devem ser atendidos por empresas que desejam fazer atividades de mineração em faixa de fronteira são:

I – pelo menos 51% (cinquenta e um por cento) do capital pertencer a brasileiros;

II – pelo menos 2/3 (dois terços) de trabalhadores serem brasileiros; e

III – caber a administração ou gerência a maioria de brasileiros, assegurados a estes os poderes predominantes.

Importante apontar que, em países como Argentina, México, USA, Canadá e Chile, por exemplo, não há restrição para que estrangeiros tenham títulos minerários em qualquer área, incluindo faixas de fronteira, nas quais é permitida atividade mineral.

De acordo com o Índice de Atratividade de Investimentos de Empresas de Mineração de 2018, publicado pelo Instituto Fraser, o Brasil aparece abaixo dos países mencionados acima, sendo certo que regulações onerosas são citadas expressamente como uma das razões para que o Brasil se torne um lugar desinteressante para investimento externo.

Não temos dúvidas que a restrição para que estrangeiros tenham títulos minerários nas faixas de fronteira brasileiras, ao longo de 15.719km de fronteiras terrestres com nove países, abarcando 11 Unidades da Federação, 588 municípios e mais de 10 milhões de habitantes, representando uma área total de 1,4 milhão quilômetros quadrados e correspondendo a 16,6% do território nacional, constitui um fator de redução da nossa atratividade, impactando significativamente no parco desenvolvimento destas áreas.

A Lei Federal nº 6.634/79 também estabelece que a Junta Comercial competente fica proibida de arquivar ou registrar contrato social, estatuto ou ato constitutivo de sociedade que atue em Faixa de Fronteira, bem como suas eventuais alterações com: mudança do objeto social; mudança do nome comercial ou endereço da sede; eleição ou substituição de diretores na administração ou gerência; alteração nas atribuições e competências de administradores; modificação na participação do capital social; aumento de capital social nos casos de emissão e/ou subscrição pública ou particular de ações; mudança na forma das ações; entrada ou retirada de novos acionistas; transformação, incorporação, fusão e cisão; retirada e/ou admissão de sócios-cotistas; ou reforma total dos estatutos ou contrato social, sem o assentimento prévio do CDN.

Se uma empresa registrar tais atos societários sem a observância da legislação, estará sujeita à multa de ATÉ 20% (VINTE POR CENTO) DO VALOR DECLARADO DO NEGÓCIO IRREGULARMENTE REALIZADO. Ou seja, uma alteração de capitalização, que não altere troca de controle, poderia expor a empresa a multas astronômicas. Ex: uma empresa que AUMENTE SEU CAPITAL NÃO VOTANTE EM U$ 10.000.000,00 (dez milhões de dólares americanos) e acabe por registrar tal alteração perante a Junta Comercial antes do assentimento prévio do CDN, estaria exposta a multa de até U$ 2.000.000,00 (dois milhões de dólares americanos).

Vale lembrar que a Lei 8.934/1994, que dispõe sobre o registro público de empresas mercantis, estabelece em seu artigo 36 que os documentos com registro obrigatório na Junta Comercial deverão ser apresentados para arquivamento dentro do prazo de 30 (trinta) dias contados de sua assinatura. Fora desse prazo, o arquivamento somente terá eficácia a partir do despacho que o conceder.

A falta de registro importa na aplicação de sanções de natureza fiscal e administrativa, impossibilitando a inscrição da pessoa jurídica no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ), nos demais cadastros estudais e municipais e no Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS), além de impossibilitar o pedido de recuperação judicial.

No caso das empresas de Mineração, o Decreto 85.064/80 determina que para que obtenham o assentimento prévio do CDN, as mesmas deverão apresentar o ato societário correspondente perante a Agência Nacional de Mineração – ANM, que será responsável por este contato com o Conselho de Defesa Nacional.

Apesar de corriqueiros, esses procedimentos têm se tornado cada vez mais burocráticos e demorados, o que acaba por trazer inúmeros prejuízos às empresas, que se veem obrigadas a viverem realidades societárias que não mais representam a realidade.

O Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) julgou o REsp nº 1.486.164-DF e decidiu que “os efeitos da cessão de quotas, em relação à sociedade e a terceiros, somente se operam após a efetiva averbação da modificação do contrato na Junta Comercial (…) A tese esposada pelas recorrentes, de que o efeitos da cessão se produziriam a partir da assinatura do respectivo instrumento, aplica-se somente na relação jurídica interna estabelecida entre cedente e cessionário, mas não quanto à sociedade e aos terceiros.”

Dessa maneira, ainda que as partes tenham acordado numa eventual cessão de quotas, o quotista retirante ficará respondendo pelos atos daquela sociedade até que o devido registro tenha sido feito na Junta Comercial. Nos casos em que tal registro dependa da aprovação do CDN, tal espera pode demorar meses, até anos, o que é completamente impraticável! Da mesma maneira, a sociedade e seus bens ficam reféns de eventuais atos daquele quotista retirante enquanto a situação não for regularizada.

A Declaração de Direitos de Liberdade Econômica – Lei 13.874, publicada em 20 de setembro de 2019, tem como objetivo principal desburocratizar e facilitar a atividade econômica no país.

O artigo 3º, inciso IX desta lei estabelece a aprovação tácita de atos públicos de liberação de atividades econômicas, cabendo a cada autoridade competente informar ao administrado, no ato da completa instrução do seu processo, o prazo máximo para sua conclusão, sendo certo que, encerrado o prazo e não havendo decisão, considerar-se-á aprovado o requerimento apresentado.

Apesar da Agência Nacional de Mineração ter publicado em 31.01.20 a Resolução nº 22 da ANM, dispondo sobre a aprovação tácita de determinados atos, não há qualquer menção a prazo máximo para diligências, tais quais o envio dos autos ao Conselho de Defesa Nacional para análise de requerimento de assentimento prévio, o que para nós é um grave lapso desta resolução, que deve ser corrigido.

Até o momento, também não foi disponibilizado, pelo Conselho de Defesa Nacional, qualquer ato normativo prevendo aprovação tácita para atos inerentes a esta entidade, o que, igualmente, restringe e dificulta o minerador que pretenda atuar nestas áreas.

Em que pese ser relevante valorizar e respeitar a garantia da soberania brasileira na faixa de fronteira, é importante que se agilize as autorizações, para que haja efetiva ocupação dessas áreas. Em geral, tais regiões têm pouca presença do Estado, o que as tornou rotas para o tráfico de drogas, armas, pessoas, animais silvestres, além de produtos de contrabando e descaminho, saída de veículos furtados e/ou roubados para crimes de evasão de divisas.

O Governo Federal tem demonstrado interesse no fortalecimento da prevenção, controle aduaneiro, repressão de ilícitos e combate ao crime organizado nas faixas de fronteira, através da criação, pelo Ministério da Justiça, do Programa Nacional de Segurança nas Fronteiras (Vigia).

Conforme dados do programa Vigia, desde abril de 2019, 223 armas foram apreendidas, além de 51 toneladas de agrotóxicos, 30 milhões de maços de cigarro, 609 veículos, 110 embarcações e 86,9 toneladas de drogas. Dados do Ministério da Justiça mostram ainda que o volume de prejuízo causado ao crime organizado alcançou R$ 7 bilhões, motivado pelas apreensões de drogas, armas, cigarros, caminhões, motos, pirataria e produtos falsificados.

Apesar dos números positivos, o programa conta, atualmente, com apenas 215 policiais trabalhando por dia, distribuídos em vários Estados.

Uma das maneiras existentes e mais eficientes para se coibir esses crimes seria a instalação de um empreendimento na área, o que, por si só, já evitaria a instalação de rotas para o crime organizado.

Poderia se sugerir, nesse sentido, que as empresas mineradoras estabelecidas em faixa de fronteira assinem termos de cooperação com o Governo Federal, no sentido de denunciar quaisquer atividades ilícitas identificadas nas poligonais do direito minerário em questão.

Dessa maneira, além de contribuir com a atividade minerária em si, o que é de interesse nacional, as mineradoras podem ser aliadas do Poder Público, no sentido de serem mais uma fonte de informação e fiscalização de eventuais atividades criminosas que assolam as regiões localizadas em faixa fronteiriça.

Para tanto, se torna imperativo desburocratizar e acelerar o procedimento de assentimento prévio do CDN, especialmente quando o requerimento diz respeito apenas a uma alteração contratual de empresa já existente e já detentora do título minerário. Por exemplo, poderiam ser alterados os dispositivos para que fosse obrigatória a consulta apenas em casos de alteração de controle, e nos demais casos se exigiria apenas informar o CDN e ANM.

A atual demora de todo o processo, repetimos, desencoraja investimentos e causa insegurança jurídica, uma vez que as empresas ficam impossibilitadas de levar a registro seus atos societários enquanto aguardam o assentimento prévio do Conselho de Defesa Nacional, o que pode levar, em alguns casos, anos.

Este artigo de: Luis Maurício Azevedo (OAB 80412 RJ) e Samantha M. de C. Bittencourt (OAB 147921 RJ), respectivamente sócio e advogada sênior da FFA LEGAL, escritório especializado no atendimento jurídico, contábil-fiscal e administrativo a empresas do ramo de mineração, e direcionado a seus clientes e parceiros.

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