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A TFRM E O IMPACTO NA CARGA TRIBUTÁRIA DO SETOR MINERÁRIO



RESUMO

Seguindo a tendência de outros Estados, a Assembleia Legislativa de Mato Grosso aprovou o projeto de lei nº 415992/2019, que institui a Taxa de Controle, Monitoramento e Fiscalização das Atividades de Pesquisa, Lavra, Exploração e Aproveitamento de Recursos Minerários – TFRM naquele Estado.


O objetivo desse artigo é analisar as novidades trazidas pelo texto, além de discutir sobre os impactos da carga tributária sempre crescente à atividade minerária e as consequências disso ao crescimento da atividade no país.


Palavras-Chave: TFRM, Mato Grosso, carga tributária, mineração.


ABSTRACT

Following the tendency of other States, the Legislative Assembly of Mato Grosso State approved the law project n. 415992/2019, which establishes the Control, Monitoring and Inspection of Exploration, Exploitation and Mineral Resources Development Tax – TFRM in that State.


This article aims to analyze the news brought by the text of such law project, and also discuss the impacts of the always rising tax burden to the mining activity and the consequences to the growth of the activity in the country.


Key words: TFRM, Mato Grosso, tax burden, mining.

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A atuação do Estado do Mato Grosso quanto à criação da taxa de fiscalização voltada para o setor mineral não é novidade, já que essa prática vem se tornando comum em outros Estados da federação. Os Estados de Minas Gerais, Amapá e Pará são os pioneiros na criação da Taxa de Controle, Monitoramento e Fiscalização das Atividades de Pesquisa, Lavra, Exploração e Aproveitamento de Recursos Minerários - TFRM.

Em outro artigo elaborado por nossa equipe, em de 29 de setembro sobre o mesmo tema, analisamos a atuação do Supremo Tribunal Federal quando decidiu pela constitucionalidade das leis estaduais nº. 19.976/2011, nº. 1.613/2011 e nº. 7.591/2011, dos Estados de MG, AP e PA, respectivamente, que instituíram a TFRM e o Cadastro Estadual de Controle, Monitoramento e Fiscalização das Atividades de Pesquisa, Lavra, Exploração e Aproveitamento de Recursos Minerários – CERM.

Com a validação, pela Suprema Corte, da cobrança de taxa estadual da atividade minerária naqueles estados, já era esperado que os demais entes federativos promulgariam leis similares.

Dessa forma, não foi nenhuma surpresa a aprovação, no último dia 19 de dezembro, de projeto de lei (número 415992/2019), no Mato Grosso, instituindo a TFRM nesse Estado.

É fato que o Estado do Mato Grosso é destaque no cenário nacional e internacional quanto ao seu desempenho e crescimento. Em 2018, o PIB estadual foi de 137 bilhões de reais e sua taxa de crescimento entre os anos de 2002 e 2018 foi da ordem de 121,3%. A média anual do PIB no período citado apresentou a taxa de 7,6%[1].


Vale mencionar que no exercício de 2021 a arrecadação de impostos alcançou 21 bilhões de reais, sendo R$ 18 bilhões só de ICMS[2]. De acordo com informações da própria Assembleia Legislativa, o objetivo do governo é arrecadar R$ 200 milhões por ano com a nova taxa[3].


O texto, apresentado no dia 12 de setembro de 2022 à Assembleia Legislativa, traz previsões similares aos textos do Amapá, Minas Gerais e Pará, mas traz inovações nunca antes vistas pelo setor mineral e que, certamente, provocarão uma corrida judicial para discutir o excesso dos valores pretendidos pela arrecadação estadual.


É preciso garantir que a cobrança da taxa esteja coerente com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade entre o valor da taxa e as atividades de controle, monitoramento e fiscalização que serão desenvolvidas pelo estado.


O Estado do Mato Grosso defende que a cobrança da TFRM trará conhecimento e informações sobre a atividade mineral tanto para a fase exploratória (fase da descoberta) quanto para a fase de lavra (fase de extração mineral) desenvolvida no estado e suprirá a ausência de fiscalização federal da ANM.


A principal inovação trazida pelo projeto é a cobrança de TFRM para a atividade de pesquisa mineral sem lavra experimental, ou seja, quando não há extração mineral e até mesmo para a lavra iniciada e paralisada.

Enquanto os demais textos estabeleceram base de cálculo na quantidade de substância extraída, o texto do Mato Grosso prevê o pagamento de taxa para a fase de pesquisa, sem extração mineral, no valor equivalente a 0,005 (cinco milésimos de inteiro) da UPFMT (Unidade Padrão Fiscal do Estado de Mato Grosso) por hectare considerada no respectivo título de autorização, que será cobrada anualmente.

Considerando que o valor da UPFMT é R$ 220,89 (duzentos e vinte reais e oitenta e nove centavos) para dezembro de 2022, um minerador em fase de pesquisa mineral em área de 10.000 hectares pagará, a partir de abril de 2023, uma TFRM de R$ 11.044,50 (onze mil e quarenta e quatro reais e cinquenta centavos) por ano.

Para o minerador, produtor de ouro e cobre por exemplo, há previsão de cobrança de R$ 3,31 grama do ouro e de R$ 414,39 por tonelada de cobre que serão apurados mensalmente através da indicação no documento fiscal relativo à venda ou transferência.

Importante lembrar que, atualmente, o minerador com projeto em fase de pesquisa mineral já paga à Agência Nacional de Mineração – ANM, uma taxa anual em fase de pesquisa, a taxa anual por hectares (TAH), calculada com base no número de hectares multiplicado por R$ 4,09 (quatro reais e nove centavos) ou R$ 6,13 (seis reais e treze centavos), em caso de prorrogação da autorização de pesquisa.

Dessa maneira, utilizando o exemplo acima, o minerador pagaria até R$ 61.300,00 (sessenta e um mil e trezentos reais) ao ano, à ANM, além de R$ 11.044,50 (onze mil e quarenta e quatro reais e cinquenta centavos) para o Estado, caso sua área fique localizada no Estado do Mato Grosso.

Importante apontar que, no caso das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) 4.785, 4.786 e 4.787, no voto do relator, o ministro Nunes Marques, foi considerado razoável a utilização do volume de minério extraído como elemento para a quantificação tributária: "Pode-se concluir que, quanto mais minério extraído, maior pode ser o impacto social e ambiental do empreendimento. Maior, portanto, deve ser o grau de fiscalização e controle do poder público”.

Dessa forma, entendeu-se que o Estado usará a TFRM para financiar a fiscalização das atividades minerárias, especialmente no que diz respeito ao impacto ambiental causado por elas.

Cabe lembrar, no entanto, que a atividade de pesquisa mineral não necessariamente apresenta risco de impacto ao meio ambiente. Tanto é assim que a Resolução CONAMA nº 237/1997 sequer lista a atividade de pesquisa mineral simples (sem lavra experimental) como uma atividade sujeita ao licenciamento ambiental.

Ora, se sequer é exigido do minerador a obtenção de licença ambiental para uma determinada atividade, como justificar a cobrança de taxa para fiscalização por parte do Estado para se garantir que nenhum impacto ambiental aconteça naquele local?

Com relação à uma possível bitributação defendida por muitos, no que diz respeito à cobrança de TFRM pelos Estados, e da TAH ou da Compensação Financeira pela Exploração Mineral – CFEM pela União, já ficou pacificado que não é o caso. Isso porque a taxa anual por hectares, apesar do nome, e a CFEM, cobradas pela ANM, têm natureza de preço público, sendo devidas em razão da concessão de título exploratório ou como contraprestação pela utilização econômica dos recursos minerais, e não para financiamento de fiscalização da atividade, ainda que essa seja uma das principais atribuições da Agência, nos termos do artigo 2º, XI da Lei 13.575/2017, enquanto que a TFRM foi criada especificamente para a fiscalização, pelo Estado, das atividades de pesquisa, lavra, exploração e aproveitamento dos recursos minerários.


Ainda que, no caso da cobrança de TAH ou CFEM e TFRM não ter ficado configurada a bitributação, fica clara a ocorrência de ilegalidade na cobrança de TFRM municipal, como é o caso dos Municípios de Ourilândia do Norte e Curionópolis, ambos do Estado do Pará, cujos Decretos 194, de 20 de junho de 2022 e 102, de 16 de dezembro de 2022, respectivamente, instituem a taxa de controle, acompanhamento e fiscalização das atividades de pesquisa, lavra, exploração e aproveitamento de recursos minerários – TFRM e o cadastro municipal de controle, acompanhamento e fiscalização das atividades de pesquisa, lavra, exploração e aproveitamento de recursos minerários.

Tais Decretos estabelecem que qualquer mineradora localizada nesses municípios tem a obrigação de se registrar junto ao cadastro municipal de controle, acompanhamento e fiscalização das atividades de pesquisa, lavra, exploração e aproveitamento de recursos minerários – CMRM, sendo certo que qualquer atividade extrativa, ainda que em fase experimental (guia de utilização em fase de pesquisa), gera a obrigação do pagamento da taxa.

Importante apontar que as TFRMs Municipal e Estadual têm a mesma natureza jurídica (taxa), o mesmo fato gerador (atividade mineral), e a mesma finalidade (o exercício regular do poder de polícia), ficando clara a bitributação, considerando que são entes federativos diversos, ainda que ambos tenham a competência concorrente de fiscalizar o meio ambiente.

Fato é que os Municípios já têm uma taxa, cuja finalidade é, também, a fiscalização das atividades, que é a taxa paga anualmente a título de renovação de alvará de funcionamento do estabelecimento minerário.

Os Municípios cobram do minerador uma taxa para conceder e renovar, anualmente, a licença de funcionamento daquele estabelecimento, tendo como premissa que a taxa é devida em razão do poder de polícia do Município, tanto que essa taxa é calculada considerando o tamanho do estabelecimento a ser fiscalizado.

Dessa forma, a taxa de alvará de funcionamento tem como finalidade financiar a fiscalização sobre as atividades desenvolvidas em determinado estabelecimento. Como determinado acima, a TFRM tem exatamente o mesmo propósito, qual seja, o financiamento de fiscalização das atividades de mineração desenvolvidas em determinado Estado brasileiro.

Apenas a título exemplificativo, afim de demonstrar como as atuais legislações oneram demasiadamente o minerador, um projeto situado no Município de Curionópolis, com sua atividade em fase pesquisa mineral com extração experimental, deverá pagar:

1. Taxa Anual por Hectares ou Compensação Financeira pela Exploração Mineral – CFEM à ANM, a depender da fase;

2. TFRM ao Estado do Pará, com base na Lei 7.591/2011, recentemente validada pelo STF;

3. TFRM ao Município de Curionópolis, bom base no Decreto 102, de 16 de dezembro de 2022;

4. Taxa de emissão e/ou renovação de alvará de funcionamento ao Município de Curionópolis, que varia de acordo com a extensão do direito minerário, com base na Lei Complementar nº 12, de 27 de dezembro de 2021, tendo chegado, em 2022, a mais de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) para mineradoras da região.

Diante de todos os argumentos apresentados, conclui-se que a criação da TFRM Municipal pode ser interpretada pelo setor como uma bitributação e que há uma série de violações que, se prevalecerem, certamente serão apreciadas pelo poder judiciário.

De outro lado, com relação à TFRM recentemente aprovada pelo Estado do Mato Grosso, é necessário que o Estado, ao regulamentar a matéria, atente que a medida, especialmente a inovação trazida na taxação da atividade mineral ainda em fase de pesquisa (sem lavra), representa um desestímulo à atração de investimentos para o Estado e contribui para a insegurança jurídica quanto à volatilidade da agenda regulatória do setor. É certo que a ANM precisa evoluir e desatar os nós com o passado, implantar uma política inteligente de fiscalização e um olhar cuidadoso para as normas e diretrizes.

Entretanto, nosso entendimento sempre acompanha a tendência de que, para o minerador tornar o negócio viável economicamente, principalmente nas etapas do descobrimento, que por suas características exigem altos investimentos e longo prazo de maturação, são necessários incentivos que fomentem a atratividade naquele Estado, atualmente respondendo por cerca de 1,5% produção mineral do país, apenas atrás dos estados do Pará(44%), Minas Gerais(41%), Bahia(2,5%) e Goiás(2,4%), e uma das novas fronteiras de crescimento acesas pelas recentes descobertas de pórfiros de cobre e inúmeros jazimentos auríferos.

É neste cenário desafiador que o Estado do Mato Grosso deve reavaliar os termos da TFRM proposta e, de fato, apoiar e fomentar a indústria mineral em seu Estado e diversificar a dependência do agronegócio, carro chefe do setor produtivo.

A redação do texto final aprovado prevê que a TFRM deverá ser revista no prazo de 01 (um) ano e a cobrança no texto da Lei terá início a partir de 1° de abril de 2023.


Este artigo é de autoria de Samantha Monteiro Bittencourt e Frederico Campos Torquato, coordenadora do departamento jurídico e advogado sênior da FFA Legal Ltda.


[1] tce.mt.gov.br [2] http://www.sindifiscomt.org/noticias/noticia.asp?id=9257&noticia=mato-grosso-registra-maior-arrecadacao-da-historia-em-2021-com-r-21-bilhoes-de-impostos [3] https://www.al.mt.gov.br/midia/texto/almt-debate-nova-taxa-para-o-setor-de-mineracao/visualizar

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