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Quais são os limites das doações corporativas a entes governamentais?



26/11/2020

RESUMO Analisamos no presente artigo os termos e condições para doações, por pessoas jurídicas, de bens, serviços, e pecúnia aos governos federal, estadual e municipal, com destaque às legislações pertinentes, em todos os âmbitos.

PALAVRAS-CHAVE: Doação, Governo, empresas.

ABSTRACT: This article analyzes the terms and conditions for donations, by companies, of goods, services and cash to the Federal, State and Municipal governments, with emphasis to the corresponding legislation, in all spheres.

Keywords: Donation, Government, companies.

Antes do advento da Lei nº 13.165 em 2015, era permitido que empresas fizessem doações políticas, nos termos da lei 9.504/97[1], as quais eram limitadas a dois por cento do faturamento bruto do ano anterior à eleição.

Atualmente, é permitido apenas às pessoas físicas fazerem doações e contribuições para campanhas eleitorais. As doações para campanhas eleitorais nas Eleições Municipais de 2020 foram normatizadas pela Resolução TSE nº 23.607/2019[2], que inclui os artigos das Leis 9.504/1997, 9.096/1995, 4.737/1965 e da Constituição Federal.

Os doadores deveriam obedecer a alguns critérios afim nas eleições de 2020: (i) as doações devem ser feitas por meio de transferência bancária com a identificação do seu número no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF); e (ii) as doações devem ser limitadas a valores que correspondam a até 10% da renda bruta anual do doador, declarada à Receita Federal, considerando o ano-calendário de 2019.

De acordo com informações do Tribunal Superior Eleitoral, foram encontrados indícios de irregularidades que ultrapassam R$ 588 milhões nas eleições 2020[3].

Fora do contexto eleitoral, no entanto, é permitido que empresas façam doações de bens móveis ou serviços, sendo certo que, no âmbito federal, os termos e condições para tanto estão estabelecidos no Decreto nº 9.764/2019[4].

A regulamentação trazida por este Decreto foi uma das ferramentas mais importantes no combate à corrupção, pois estabeleceu os critérios e procedimentos para doações por pessoas físicas ou jurídicas, dando, também, segurança jurídica às pessoas que tenham interesse em doar, especialmente quando cada vez mais as empresas têm se preocupado e ficado adeptas à práticas de compliance e governança corporativa.

Antes do Decreto nº 9.764/2019, simplesmente não havia regulamentação sobre doações feitas a órgãos e entidades que integram a estrutura da Administração Pública federal direta, o que também causava extrema insegurança e desencorajava tais contribuições.

Em 07 de abril de 2020 foi publicado o Decreto nº 10.314/2020, que modificou o Decreto 9.764/2019, ampliando as doações da sociedade e de empresas para reforçar o combate à pandemia da COVID-19.

O Decreto nº 10.314/2020 passou a permitir ao governo receber doações assumindo encargos ou condições estabelecidos pelo doador do bem móvel ou do serviço, situação vedada no texto original.

A legislação autoriza a doação de bens móveis e serviços, que auxiliem na melhoria da gestão pública, não sendo admitidas doações em casos em que (i) houver ou em que se possa haver conflito de interesses, (ii) se origine obrigação futura de contratação, ou (iii) se gere responsabilidade subsidiária ou despesa adicional, tornando a doação antieconômica.

O Decreto é regulamentado pela Instrução Normativa 05/2019, a qual expressamente proíbe doações: “I – que visem à promoção de candidatos, autoridades ou partidos políticos; II – em pecúnia, ressalvados os casos previstos em lei; III – que gerem ou possam gerar obrigações ou encargos futuros à Administração, exceto aqueles decorrentes de sua utilização, desde que não evidenciada a antieconomicidade; IV – direcionadas a agente público específico; V – cujo objeto seja ilícito; VI – cujo órgão ou entidade donatário seja responsável pela fiscalização da atividade do doador; ou VII – que atentem contra os princípios da administração pública”.

Existe, portanto, proibição de que a donatária se promova através da doação, devendo se abster de fazer publicidade com os bens móveis e serviços doados, sendo autorizado, no entanto, menção informativa da doação no site do doador na internet ou menção nominal do doador no site do órgão ou da entidade beneficiada, quando se tratar de auxílio a programa ou a projeto de governo.

Este dispositivo está em consonância com o princípio da impessoalidade, previsto no artigo 37, §1º da Constituição Federal, que determina que “a publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos”.

Também existem impedimentos no que diz respeito ao doador, ou seja, pessoas físicas condenadas por ato de improbidade administrativa ou crime contra a administração pública ou empresas que tenham sido declaradas inidôneas, suspensas, impedidas de contratar com a administração pública, ou ainda que tenham condenações por improbidade administrativa ou estiverem em débito com a seguridade social, ficam impedidas de doar para o governo.

Os procedimentos para tais doações são: chamamento público ou manifestação de interesse, quando se tratar de doação sem ônus ou encargo e manifestação de interesse, quando se tratar de doação com ônus ou encargo.

O objetivo de se vincular eventuais doações aos procedimentos listados acima é garantir a isonomia entre todos os possíveis interessados, bem como assegurar transparência e publicidade dos atos públicos, facilitando, dessa maneira, a participação e colaboração dos potenciais doadores.

O chamamento público é feito através de publicação de edital, no qual a administração pública determina quais bens móveis ou serviços são necessários, devendo os interessados apresentarem propostas, as quais serão analisadas pela Central de Compras da Secretaria de Gestão da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia, que selecionará as mais adequadas aos interesses da administração pública.

O potencial doador poderá manifestar seu interesse na doação através de cadastro no sítio eletrônico do Reuse.gov, o qual será analisado pela Central de Compras da Secretaria de Gestão da Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia.

Estando em conformidade com os requisitos legais, caberá a essa Central de Compras a publicação do anúncio da doação, que permanecerá disponível pelo período de dez dias, no caso das doações sem encargos, para que os donatários indicados aceitem a doação ou os órgãos e as entidades interessados se candidatem a receber a doação ou, no caso das doações com encargos, para que outros doadores interessados apresentem propostas de doações correlatas e os donatários indicados aceitem a doação e o respectivo encargo ou os órgãos e as entidades interessados se candidatem a receber a doação, nos termos apresentados.

Interessante apontar que o Governo somente fará o chamamento público quando não houver oferta dos bens e serviços em questão no Reuse.gov, ou seja, o Governo deverá checar primeiro se existem manifestações de intenção de doação registradas no site para, então, partir para a publicação do edital de chamamento público.

As doações e contribuições deverão ser formalizadas através de termo ou contrato de doação, os quais serão publicados no Diário Oficial da União pelo órgão ou pela entidade beneficiada.

No âmbito da administração pública Estadual, alguns Estados promulgaram normas próprias, nos mesmos termos e condições do Decreto Federal, quais sejam: recebimento de doações, sem ônus ou encargos, de bens móveis e de serviços de pessoas físicas ou jurídicas de direito privado pelos órgãos e pelas entidades da Administração Pública Estadual Direta, Autárquica e Fundacional.

No caso do Estado do Pará, a possibilidade de receber tais doações está prevista no Decreto 796/2020[5], devendo ser utilizado o canal eletrônico http://seplad.pa.gov.br/doar-pa/, gerido pela Secretaria de Estado de Planejamento e Administração (Seplad), nos mesmos moldes do sítio eletrônico Federal Reuse.gov.

O Paraná tem legislação similar, tendo sido publicada durante a pandemia, e motivada por esta – Decreto Nº 5551/2020[6].

No caso de Estados como Minas Gerais (Decreto 47.611/2019[7]) e São Paulo (Decreto 58.102/2018[8]), é importante apontar que os mesmos serviram de inspiração para o Decreto Federal, uma vez que os Decretos Estaduais são anteriores à legislação federal.

Enquanto a legislação proíbe expressamente a doação em espécie (pecúnia), direcionando essas doações a Fundações ou Fundos Sociais (ex: Governo Federal, que direciona doações em espécie à Fundação Banco do Brasil, e Governo do Estado de São Paulo, que direcionou doações em espécie, durante a pandemia, para o Fundo Social de São Paulo), alguns Estados e Municípios preveem essa possibilidade em legislação própria local, como é o caso do Município de Osasco – Decreto 11.453/2017[9].

Tal discrepância legislativa, no entanto, causa incerteza e insegurança jurídica, o que acaba por afastar grande número de doadores, especialmente entre as empresas, considerando o crescimento exponencial de responsabilidade com regras de compliance, gestão de risco e governança corporativa.

As empresas que tiverem interesse em fazer doações a entes governamentais devem, portanto, fazê-lo observando os termos e condições estabelecidas no Decreto nº 9.764/2019, garantindo, assim, a conformidade com as regras de governança corporativa.

Este artigo é de autoria de: Samantha Bittencourt, advogada sênior da FFA LEGAL, escritório especializado no atendimento jurídico, contábil-fiscal e administrativo a empresas do ramo de mineração, e direcionado a seus clientes e parceiros.

[1] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9504.htm

[2] https://www.tse.jus.br/legislacao/compilada/res/2019/resolucao-no-23-607-de-17-de-dezembro-de-2019

[3] https://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2020/Novembro/indicios-de-irregularidades-em-doacoes-nas-eleicoes-2020-ja-somam-mais-de-r-588-milhoes

[4] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/Decreto/D9764.htm

[5] https://www.semas.pa.gov.br/legislacao/normas/view/6562

[6] https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=400755

[7] https://www.almg.gov.br/consulte/legislacao/completa/completa.html?tipo=DEC&num=47611&comp=&ano=2019

[8] https://leismunicipais.com.br/a/sp/s/sao-paulo/decreto/2018/5810/58102/decreto-n-58102-2018-regulamenta-o-recebimento-de-doacoes-e-comodatos-de-bens-exceto-imoveis-bem-como-de-doacoes-de-direitos-e-servicos-sem-onus-ou-encargos-pelos-orgaos-da-administracao-direta-autarquias-fundacoes-e-servicos-sociais-autonomos-institui-o-selo-amigo-da-cidade-de-sao-paulo

[9] https://leismunicipais.com.br/a/sp/o/osasco/decreto/2017/1145/11453/decreto-n-11453-2017-estabelece-procedimentos-para-o-recebimento-de-doacao-de-bens-servicos-ou-valores-pecuniarios-e-o-estabelecimento-de-parcerias-de-colaboracao-com-a-iniciativa-privada

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